O comércio global desmoronou no primeiro semestre, no rastro da pandemia da covid-19, mas uma exceção tem sido a resiliência das transações de produtos agrícolas, com destaque para as exportações do Brasil. É o que apontou levantamento da Organização Mundial do Comércio (OMC) divulgado ontem.
As respostas iniciais à pandemia levaram diversos países a facilitar ou restringir o comércio de produtos agropecuários, impor novos controles sanitários e elevar os estoques de alguns itens em razão de preocupações com a segurança alimentar.
Nesse cenário, o comércio agrícola resistiu mais, uma vez que a demanda continuou firme e porque o fluxo de transporte em navios não sofreu grande disrupção. Assim, as exportações agrícolas e de alimentos em geral cresceram 3,3% em março, 0,6% em abril e, em maio, houve apenas uma leve retração, de 1,3%.
É verdade que a demanda por produtos como madeira e flores caiu dramaticamente, mas houve crescimento no caso de alimentos básicos e frutas e vegetais processados, inflado pelo pânico inicial de consumidores com eventuais faltas de alimentos, que levou a uma onda de formação de estoques.
Em abril, as exportações caíram também em segmentos de produtos de maior valor agregado como carnes e lácteos, que também são mais dependentes de vendas para restaurantes, escolas e para o setor do turismo, praticamente paralisados pelas medidas de isolamento social adotadas no combate à covid-19.
O impacto variou entre as regiões. As exportações agrícolas da Ásia declinaram em março, e o mesmo aconteceu com as vendas da Europa e da América do Norte em abril. Já as exportações da América do Sul registraram os maiores crescimentos, impulsionadas por demanda da Ásia, sobretudo da China, por produtos como soja, açúcar e carnes.
Conforme a OMC, esse desempenho positivo veio principalmente do aumento das exportações agrícolas do Brasil - de 14,2% em março e 30,6% em abril em relação aos mesmos meses de 2019 -, que representam metade dos embarques agrícolas sul-americanos.
As exportações brasileiras de soja, açúcar e carnes aumentaram significativamente, realçou a OMC. A demanda aquecida e a desvalorização do real também ajudaram a sustentar as vendas brasileiras do setor nos meses seguintes (junho e julho), como já informou o Valor.
Os preços de alimentos, contudo, continuaram com tendência de baixa. A crise da covid-19 elevou a pressão baixista sobre as cotações e sobre a renda dos produtores que não tiveram o câmbio como compensação, como os brasileiros. Em junho, houve a primeira alta nos preços globais dos alimentos, mas a expectativa é que os níveis continuem baixos em meio à fraca atividade econômica.
Mas, enquanto os estoques e a produção de grãos básicos (arroz, trigo e milho) estão historicamente altos e os preços seguem em baixa, o impacto da pandemia sobre empregos e renda aumenta o número de pessoas famintas no mundo.
A OMC menciona estimativas que indicam que 270 milhões de pessoas estarão sofrendo com insegurança alimentar no fim deste ano - 82% mais do que antes da pandemia. Ou seja, produzir e estocar alimento não é suficiente se o produto não chega a quem precisa.
Embora o comércio agrícola esteja mostrando força, a OMC alerta que disrupções adicionais nas cadeias de valor poderão minar essa resiliência, com consequências certamente negativas.
Fonte: Valor Econômico
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