A geração de energia elétrica das térmicas a biomassa tem demonstrado vigor neste ano diante do forte desempenho da queima do bagaço da cana-de-açúcar no país. Os efeitos do clima seco sobre a cultura "turbinaram" a cogeração a partir de biomassas em geral, que cresceu 11% do início do ano até agosto e, em julho, bateu recorde histórico.
As térmicas a biomassa entregaram 17.356 gigawatt-hora (GWh) para o Sistema Interligado Nacional (SIN) de janeiro a agosto, um crescimento de 11% na comparação com o mesmo período do ano passado, segundo levantamento da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (UNICA) a partir de dados preliminares da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). A cana responde por 77% de participação nessa matriz.
Apenas em julho, a energia gerada a partir do bagaço da cana alcançou 3.066 GWh (o equivalente a 4.121,3 megawatts médios). Foi a primeira vez na história em que as usinas sucroalcooleiras geraram mais de 4 mil MW médios em um mês, segundo a CCEE.
As térmicas a biomassa no país entregaram 3.538 GWh em julho, alta anual de 8%. Em relação a toda a energia gerada em julho, a biomassa representou 7,8%, a maior participação da história na matriz energética nacional em um mês.
Desse aumento da cogeração, 5% resultaram do aumento da produtividade por causa do clima. "Houve um adensamento da safra em julho em função da condição hídrica [seca]. Além disso, a presença de fibra na cana fica maior percentualmente do que em outros períodos", aumentando a concentração de biomassa na planta, explica Roberto Castro, membro do conselho de administração da CCEE.
Além disso, o fato de não terem ocorrido interrupções na cogeração em decorrência da chuva também poupou o autoconsumo de energia que costuma ocorrer para retomar a geração, observa Zilmar de Souza, gerente em bioeletricidade da Unica.
Os demais 3% de crescimento, acrescenta Castro, derivaram da entrada de sete novas plantas em operação e, sobretudo, de melhorias nos equipamentos das unidades, como novas caldeiras e turbogeradores.
Os aportes para melhorar a potência de unidades de cogeração têm absorvido nas últimas safras a maior parte da atenção das poucas usinas que continuam realizando novos investimentos em sua área industrial.
Mas esse fortalecimento da cogeração a biomassa também tem gerado um impasse. Muitas usinas, segundo Souza, tem gerado mais eletricidade do que o previsto para entregar em contratos no ambiente regulado (via leilões) e no ambiente livre (negociado diretamente com consumidores).
Não seria uma má notícia se os geradores estivessem recebendo pela energia entregue no mercado de curto prazo – um acerto de contas entre as empresas do setor realizado pela liquidação do Preço de Liquidação das Diferenças (PLD).
"Seria bom, porque o PLD está alto, em R$ 500 o MWh. Considerando o excedente, isso estaria ajudando o caixa das usinas. Mas, na prática está agravando, porque estamos acumulando crédito que não estamos recebendo", afirma.
O passivo total para os geradores no país que está sendo contestado na Justiça atualmente é de R$ 7,8 bilhões, segundo a CCCEE. Desse montante, o gerente da Unica avalia que o valor devido aos geradores de bioeletricidade esteja entre R$ 300 milhões e R$ 400 milhões. Segundo Souza, as usinas a biomassa não receberam nenhum pagamento a que têm direito nos últimos três meses.
Essa situação tem colocado um limite ao impulso à expansão da geração de eletricidade a biomassa, afirma o gerente da Unica. Em seu cálculo, o setor deve deixar de gerar entre 10% e 15% da energia a ser cogerada nesta safra. Tomando como base a cogeração do ano passado, que foi menor que a atual, esse percentual seria o equivalente a cerca de 2 terawatt-hora (TWh), o suficiente para abastecer 1,5 milhão de residências durante um ano inteiro.
Tanto Castro como Silva têm expectativa de que sejam liberadas essas compensações quando for aprovado projeto de lei que tramita no Senado retirando as ações judiciais que bloqueiam os pagamentos.
Por Camila Souza Ramos
Fonte: Valor Econômico
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