Incêndio na região de Araraquara, no interior paulista: consultorias têm reduzido suas estimativas para a moagem de cana
A estiagem que atinge o Centro-Sul do país desde abril está acentuando a já esperada quebra da atual safra de cana, a 2018/19, e pode prejudicar a próxima temporada (2019/20). A situação é agravada por incêndios decorrentes da seca e pela falta de renovação das lavouras. Ainda não há projeções para a próxima safra, mas as estimativas para o ciclo atual têm sido reduzidas nas últimas semanas.
Até a quarta-feira passada (dia 25), praticamente todo o Estado de São Paulo e Mato Grosso do Sul, além de áreas do Triângulo Mineiro e do norte do Paraná, estavam sem chuvas por um período de 30 a 60 dias, de acordo com mapas do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A situação é mais grave no extremo norte paulista, em boa parte de Goiás e na porção oeste de Mato Grosso, onde a falta de chuvas supera dois meses.
As áreas de cana de Ribeirão Preto e São José do Rio Preto, no Estado de São Paulo, estão entre as áreas mais afetadas, segundo a União das Indústrias de Cana-de-Açúcar (Unica). "Essa seca está mais forte que o esperado", avalia Luiz Eduardo Junqueira Figueiredo, diretor financeiro do grupo Lincoln Junqueira, que tem três usinas no Paraná e duas em São Paulo.
Mesmo as últimas chuvas registradas foram insuficientes. O déficit de precipitação gira em torno de 50 milímetros a 99 milímetros por mês sobretudo em São Paulo e no Paraná desde abril, também de acordo com os mapas do CPTEC/INPE.
As consequências sobre a safra atual devem começar a aparecer com mais intensidade a partir de julho, já que as áreas colhidas até junho ainda não haviam sido impactadas. Em relatório na quarta-feira passada, a Unica informou que dados apurados pelo Centro de Tecnologia Canavieira (CTC) com 81 empresas do Centro-Sul indicam queda de 4,3% na produtividade da cana colhida nos primeiros quinze dias de julho, para 81,9 toneladas por hectare.
Embora o tempo seco costume beneficiar a concentração de sacarose na cana (ATR), Antonio de Padua Rodrigues, diretor técnico da Unica, avalia que esse aumento compensará apenas 50% da quebra da colheita de cana.
Na safra atual, a área de cana já deverá ser menor do que na última, avalia. Para esta temporada, 14% da extensão cultivada com cana no Centro-Sul foi renovada, abaixo do patamar ideal de 18% para ao menos evitar o envelhecimento dos canaviais, afirma.
Padua receia que as consequências da estiagem atual se estendam pelo próximo ciclo. "Grande parte da cana que foi plantada neste ano está morrendo por falta de chuva", afirma. Segundo o diretor da Unica, a seca está matando parte das lavouras de cana com ciclo de produção de um ano e meio, que foram plantadas entre janeiro e março deste ano e que seriam colhidas em meados de 2019.
Além disso, produtores que planejavam plantar em abril e maio desistiram por causa da continuidade do clima adverso. "Muitos que não plantaram no início do ano a cana [que tem um ciclo de crescimento] de um ano e meio iam plantar agora, mas não vão mais por falta de chuva", observa.
Plinio Nastari, presidente da consultoria Datagro, avalia que é precipitado afirmar que a próxima safra será menor. Ele lembra que há previsões de possível formação de El Niño a partir de setembro ou outubro, o que costuma estar associado a aumento de chuvas ao sul país. "Se chover acima da média, pode recuperar o atraso do desenvolvimento das soqueiras", disse durante intervalo do Global Agribusiness Fórum (GAF), na terça-feira passada.
A Datagro já reduziu sua estimativa para a moagem de cana na safra atual em 5 milhões de toneladas, para 557 milhões de toneladas. E, mesmo que espere aumento do teor de sacarose, Nastari prevê agora uma redução de 5,3% da quantidade total de açúcares totais recuperáveis (ATR) ante a safra passada.
A seca também tem aumentado o número de focos de incêndio em canaviais, segundo Padua. Na região de atuação da Associação dos Plantadores de Cana do Oeste de São Paulo (Canaoeste), por exemplo, desde o início do ano até terça-feira foram registrados 2.682 focos de incêndio.
A maior parte dos casos ocorre nos canaviais margeados por rodovias, afirma Fábio Soldera, agrônomo da Canaoeste. "Pode ser [causado] por bituca de cigarro, caco de vidro que reflete na palha, espelho, ou até incêndio criminoso", diz. E o pior ainda está por vir, acrescenta, já que o período tradicionalmente mais crítico para incêndios é em agosto.
Por Camila Souza Ramos
Fonte: Valor Econômico
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