A severa estiagem no centro-sul do Brasil, que vem desde o outono, acendeu o sinal de alerta para as safras de café e cana do próximo ano, uma vez que tais culturas tendem a chegar ao período úmido, a partir de setembro, sem muita margem para chuvas abaixo da média, disseram especialistas à Reuters.
Por ora, a seca tem contribuído para o avanço da colheita das lavouras, mas o foco já se volta para as precipitações futuras, uma vez que o solo está com umidade bem reduzida em alguns locais, especialmente Paraná e São Paulo.
“O sinal de alerta está ligado, porque nesse período de abril até julho choveu bem abaixo da média. Isso já está afetando a safra de cana em andamento e a próxima vai depender demais das chuvas de verão”, afirmou o sócio-diretor da consultoria Job Economia e Planejamento, Julio Maria Borges.
“Se chover legal, até recupera, porque a cana é resistente. Mas essa recuperação vai depender da qualidade e do padrão da chuva. Por enquanto, o sinal é amarelo”, acrescentou.
Nos últimos 120 dias, as precipitações ficaram aquém do normal em praticamente todo o centro-sul, principal região produtora de cana do Brasil, o maior player global do setor sucroenergético.
No centro-oeste do Paraná, por exemplo, as chuvas registradas ficaram 300 milímetros abaixo da média, enquanto em Ribeirão Preto (SP), principal polo produtor do país, choveu 157 milímetros a menos, conforme o Thomson Reuters Agriculture Weather Dashboard.
Mato Grosso do Sul, Minas Gerais e Goiás também não viram muita água nesses últimos três meses.
A cana tem um ciclo anual e, após sua colheita, as chamadas soqueiras passam a depender de um regime hídrico regular para o pleno desenvolvimento da planta até a safra seguinte. Na temporada vigente, ainda há mais da metade das lavouras para serem colhidas.
Na esteira da seca, consultorias vêm reduzindo suas previsões para o volume de safra neste ano. Recentemente, foi a INTL FCStone que cortou sua estimativa de moagem ao menor nível desde 2014/15.
“É indiscutível que o tempo seco de fato afetou significativamente as lavouras do centro-sul. Entre os meses de fevereiro e junho, a precipitação sobre o cinturão canavieiro registrou 378 mm, 31,4 por cento abaixo do ano passado e 33,4 por cento a menos do que a média histórica”, comentou o analista de mercado da INTL FCStone, João Paulo Botelho, em comunicado.
Uma nova queda na safra de cana do Brasil poderia potencialmente colaborar para uma redução no excedente de açúcar projetado para o mundo na próxima temporada, além de reduzir a oferta de etanol no mercado brasileiro.
CAFÉ
Assim como a cana, o café também desperta atenção por causa da estiagem no Brasil, o maior produtor e exportador global da commodity e que deve colher um recorde de cerca de 58 milhões de sacas em 2018.
O pesquisador Lucas Bartelega, da Fundação Procafé, explicou que os cafezais devem chegar ao período úmido um pouco mais “depauperados”, algo normal após safras grandes como a deste ano, de bienalidade positiva para o arábica, quando as plantas ficam carregadas e demandam mais nutrientes.
E é justamente por isso que as chuvas ganham ainda mais importância para o desenvolvimento do próximo ciclo.
“O que agrava é que entramos no período seco com baixo armazenamento de água no solo. Se vier setembro, outubro, e essa situação se mantiver, daí poderemos ter problemas... O produtor tem de ficar atento, embora não tenha muito o que fazer agora”, afirmou, acrescentando que os cafezais do Triângulo Mineiro e de partes do sul de Minas Gerais são os que mais têm sentido a seca.
Com efeito, nesses dois locais as chuvas ficaram 63 milímetros e 127,5 milímetros, respectivamente, abaixo do usual nos últimos três meses, segundo o Thomson Reuters Agriculture Weather Dashboard.
O consultor Gil Barabach, da Safras & Mercado, concorda que o momento é de atenção, mas ressaltou ser “muito cedo” para se falar de perda de produtividade em 2019.
“É normal ter pouca chuva neste período de colheita... Se a gente continuar assim, avançar para setembro, outubro, quando costumam ocorrer as floradas, aí muda o discurso.”
O Brasil iniciou a colheita deste ano com estoques baixos, e uma potencial queda maior na produção de café em 2019, quando a safra deve ser menor, pelo ciclo de baixa bianual, poderia colocar pressão altista nos preços globais.
CHUVAS IRREGULARES?
Segundo o agrometeorologista Marco Antonio dos Santos, da Rural Clima, há uma tendência de que o período de chuvas chegue um pouco mais cedo neste ano, na virada de agosto para setembro, mas de forma “muito irregular”.
“Apesar de institutos estarem apontando para um retorno do El Niño por causa do aquecimento das águas nas regiões central e oeste do Pacífico, a parte leste, que banha a América do Sul, ainda se mantém com temperaturas abaixo da média, e por isso as chuvas serão irregulares quando chegarem”, disse, referindo-se ao fenômeno climático geralmente associado a mais precipitações no Brasil.
O agrometeorologista comentou ainda que, de fato, o centro-sul do país “carrega um estresse hídrico muito acentuado” e que as lavouras precisarão de mais chuva do que em outros anos.
Fonte: Reuters
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