Ipyporã na língua guarani significa “belo começo” e essa é a intenção da equipe de pesquisadores da Embrapa ao desenvolver o primeiro híbrido de braquiária da Empresa, a BRS RB331 Ipyporã. A cultivar é resultado do cruzamento de Brachiaria ruziziensis (R) com Brachiaria brizantha (B) e reúne as melhores características de cada uma delas, na opinião dos envolvidos na criação do material e que a consideram um novo início para as pesquisas em melhoramento de braquiárias no País.
“A cultivar apresenta a excelente resistência a cigarrinhas de uma B. brizantha e o alto valor nutritivo da B. ruziziensis”, revela a melhorista da Embrapa Cacilda Borges do Valle. O material é aproximadamente 13% melhor em qualidade nutricional que o capim mais utilizado no Brasil, o Marandu, e isso proporciona um ganho de peso por animal maior, ao redor de 17%. Ela ressalta ainda o fato de ser o primeiro híbrido de braquiária desenvolvido pela Embrapa em parceria com a Associação para o Fomento à Pesquisa de Forrageiras (Unipasto), fortalecendo o Brasil como o único país que faz melhoramento genético do gênero.
A pesquisadora detalha que o cruzamento, realizado na Embrapa em Campo Grande (MS), destacou-se entre 1.500 outros híbridos e após 13 anos intermitentes de avaliações liberou-se o uso comercial. “O novo híbrido é um marco para a pesquisa, por ser um cruzamento direto entre as duas espécies, selecionado por sua persistência, resistência às cigarrinhas e alto teor de folhas”, comemora Valle. Daqui em diante será uma rotina para os pesquisadores o cruzamento por recombinação. “Temos hoje um dinâmico programa de melhoramento com perspectivas muito boas de geração de novas combinações”, resume.
O longo período em teste foi necessário para avaliar resistência a cigarrinhas, resposta à fertilidade, pastejo, tolerância ao encharcamento e multiplicação de sementes. O trabalho envolve pesquisadores da Embrapa Gado de Corte (MS), Embrapa Agrossilvipastoril (MT), Embrapa Agropecuária Oeste (MS), Embrapa Amazônia Oriental (PA), Embrapa Gado de Leite (MG), Universidade Estadual de Maringá (UEM) e Unipasto para a multiplicação e futura comercialização exclusiva de sementes.
Em uma pecuária intensiva, de ciclo mais curto e animais de categorias mais exigentes, como bezerros desmamados, vacas em terço final de gestação e em lactação, o capim-Ipyporã é uma alternativa para a diversificação da pastagem no bioma Cerrado, recomenda Cacilda. A agrônoma comenta que, nos biomas Amazônia e Mata Atlântica, os ensaios estão em andamento.
Resistência a cigarrinhas
Além de inovar por ser o primeiro híbrido de braquiária lançado pela Embrapa, a forrageira destaca-se pela resistência a diferentes espécies de cigarrinhas, constatada tanto em relação àquelas típicas das pastagens, como Notozulia entreriana e Deois flavopicta como em duas do gênero Mahanarva–M. fimbriolata, da cana-de-açúcar, e Mahanarva sp.
“Ao constatarmos resistênciaem uma primeira avaliação, a planta é novamente testada para confirmação. Esse híbrido foi avaliado inúmeras vezes, com diferentes espécies de cigarrinhas e apresentou resultados consistentes”, afirma o entomologista da Embrapa José Raul Valério. Ele explica que a planta pode ser resistente ao inseto por diferentes mecanismos e nos estudos da Embrapa utiliza-se o de antibiose, no qual se mede o efeito da planta no desenvolvimento e na sobrevivência dos insetos. O especialista recorda que o novo material apresentou desde o início dos testes um alto nível de antibiose, o que despertou a atenção da equipe. O uso de gramíneas resistentes como alternativa de controle é uma opção de baixo custo e fácil adoção.
A pesquisa
Nessas avaliações, basicamente, as cigarrinhas são criadas nas plantas e comparadas com plantas testemunhas, reconhecidamente suscetíveis e resistentes. No acompanhamento dos ensaios, que duram o ciclo de vida do inseto, se observa a taxa de sobrevivência: quantos adultos emergem (percentagem) e a duração do período ninfal (tempo para a emergência da cigarrinha adulta). Plantas consideradas mais resistentes por antibiose, como o híbrido Ipyporã, demonstram sobrevivência mais baixa e prolongado período ninfal.
Para reforçar a confiabilidade, em Sinop (MT), região pré-Amazônica, o capim é avaliado desde fevereiro de 2015 na Embrapa Agrossilvipastoril e, enquanto a forrageira testemunha sofre com surtos de cigarrinhas, a nova cultivar não apresenta sintomas de ataque, relata o pesquisador Bruno Pedreira.
Esses insetos são as principais pragas de gramíneas forrageiras e, em níveis populacionais elevados, reduzem o crescimento, a produção e a qualidade do pasto. O cenário se agravou com o aparecimento em pastagens de altas infestações do gênero Mahanarva, comumente associadas, até então, a gramíneas de maior porte como a cana-de-açúcar e o capim-elefante.
Ganhos no pastejo
O desempenho do capim no campo é outro ponto positivo. Após dois anos em avaliação em pastejo rotacionado em Mato Grosso do Sul, concluído em setembro de 2014, a BRS Ipyporã apresentou elevado valor nutritivo e ganho médio diário maior, em comparação com o capim-marandu, o ‘braquiarão’ ou ‘brizantão’, forrageira mais plantada no Brasil, ao redor de 40%, de acordo com informações da Unipasto.
Nos ensaios, acompanhados pelas pesquisadoras da Embrapa Valéria Pacheco Euclides e Denise Baptaglin Montagner, com duas estações de águas e duas de seca, o valor nutritivo da folha do híbrido teve média de 12,6 % de proteína, 68% de digestibilidade e 67,7% de fibra FDN (fibra insolúvel em detergente neutro). Os números do marandu, por sua vez, foram: 11,1%, 62% e 70%, respectivamente.
Na balança, a média de ganho médio diário da BRS Ipyporã foi de 0,675 kg/animal.dia, e de ganho de peso vivo por área, 1.150 kg/ha.ano. O braquiarão alcançou uma média GMD em 0,578 kg/animal.dia e GPVA, 1.190 kg/ha.ano. “A taxa de lotação do marandu é maior e ele cresce mais que a ipyporã, porém o híbrido tem mais qualidade nutricional, a taxa de digestibilidade é alta e consegue-se melhor performance no ganho médio diário. A taxa de lotação do marandu é compensada pelo ganho de peso da ipyporã”, analisa Valéria Pacheco, especialista em manejo de pastagem.
Em Sinop, os experimentos em produção animal são recentes (julho de 2016), e os resultados promissores, segundo Bruno Pedreira, pesquisador da Embrapa Agrossilvipastoril. Ele revela que nos primeiros quatro meses de coleta, o ganho médio diário de novilhos Nelore foi acima de 750 gramas/dia na época seca (junho-setembro/2016), sem nenhum tipo de suplementação alimentar, apenas sal mineral. “Isso demonstra o potencial do material”, afirma Pedreira.
Valéria Pacheco ressalta que quanto mais cedo o animal atingir o peso adequado, menos tempo ficará no pasto e emitirá menos gases de efeito estufa (GEE). Assim, o híbrido traz um ganho adicional, o de mitigador de GEE. Entretanto, a engenheira-agrônoma pondera que a gramínea é recomendada para solos de média fertilidade e não apresenta resistência a solos encharcados. Por esse motivo não é indicada para áreas com problemas de drenagem ou com incidência da síndrome da morte do capim-marandu.
Mercado e programa de melhoramento
De acordo com a Associação Brasileira de Sementes e Mudas (Abrasem), as cultivares com tecnologia Embrapa respondem por mais 60% do mercado de sementes de forrageiras comercializadas no País. Os materiais mais recentes da Empresa no mercado são o híbrido de panicum BRS Tamani, lançado há dois anos; e a braquiária BRS Paiaguás de 2013.
“A quebra em aproximadamente 50% na produção de sementes em 2016 devido a condições climáticas causou uma demanda reprimida para este ano e a expectativa em torno dos lançamentos é grande”, admite o presidente da Unipasto, Pierre Patriat. O agrônomo ratifica a necessidade de diversificação da pastagem, com três ou quatro cultivares na propriedade rural, preconizada pelos especialistas da Embrapa. Ele lembra que a monocultura por décadas do capim-marandu e, posteriormente, mombaça e tanzânia acarretou problemas e as maiores vantagens da diversificação são proteger o produtor rural das adversidades e o meio ambiente de possíveis desequilíbrios.
Outro fator que justifica o aumento na demanda por sementes de forrageiras é o aumento na adoção de sistemas integrados. Vitor Del Alamo, pesquisador da Embrapa Produtos e Mercado (DF), considera que a forrageira inserida como cultura nesses sistemas, usada tanto na produção de palha para plantio direto quanto no pastejo permite projetar um aumento na demanda para os próximos anos.
Ele relembra o pioneirismo da empresa no desenvolvimento de novos produtos, principalmente em cultivares, que permitiram colocar o Brasil como maior exportador mundial de forragens e domínio no mercado internacional. Para manter-se nessa posição, Sanzio Barrios, melhorista e líder do projeto de melhoramento de braquiárias da Embrapa, destaca que os pesquisadores empreendem ações visando atender à demanda por cultivares alternativas, em busca de maior tolerância a solos com drenagem deficiente, maior resistência à seca e às cigarrinhas-das-pastagens e doenças como a mancha-foliar por Bipolaris.
Dalízia Aguiar (MTb 28/03/14/MS)/Embrapa Gado de Corte Gabriel Faria (MTb 15.624/MG) / Embrapa Agrossilvipastoril
Fonte: Diário da Manhã
16 3626-0029 / 98185-4639 / contato@assovale.com.br
Criação de sites GS3