A perspectiva de que falte açúcar para abastecer todo o consumo mundial ao menos até a safra 2017/18 começou a estimular os primeiros investimentos no aumento da capacidade de produção no Brasil. E quem tem liderado esses movimentos são as destilarias, que foram menos afetadas pela crise do setor nos últimos anos.
As iniciativas ainda são pontuais, mas chamam a atenção. Na avaliação da consultoria FGAgro, já há decisões de investimento no setor que podem levar a um aumento do potencial de produção de açúcar em 500 mil toneladas.
O pioneirismo das destilarias nesse primeiro ciclo de investimentos após a crise dos últimos cinco anos explica-se em parte porque elas não dependiam do açúcar quando seus preços estavam deprimidos. Além disso, "em geral, elas não têm muita dívida em dólar e não sofreram com a alta recente, e em geral trabalham com alavancagem menor", afirmou William Hernandes, da FGAgro.
Parte das usinas que têm se lançado nessa iniciativa está negociando com outras empresas do setor para financiar o investimento. Esse é o caminho das negociações da Tietê Agroindustrial, antiga Ruette Agroindustrial, para construir uma fábrica de açúcar em sua usina de Ubarana, atualmente voltada apenas à produção de etanol. A companhia deverá receber um aporte de R$ 40 milhões a R$ 50 milhões para começar a produzir açúcar já na próxima temporada. O investimento ainda está sendo negociado com duas companhias brasileiras que comercializam o produto.
"É um orçamento base. Já tivemos aprovação do conselho de administração e estamos atrás do financiamento", afirmou Dario Gaeta, diretor presidente da Tietê, ao Valor. A companhia pretende fechar um acordo no qual o parceiro tenha em contrapartida um compromisso da Tietê de entrega do açúcar a ser produzido na fábrica.
A unidade de Ubarana processa atualmente até 1,3 milhão de toneladas de cana-de-açúcar. O aporte elevará essa capacidade inicialmente para 1,6 milhão de toneladas e permitirá uma flexibilidade sobre a destinação do caldo de cana para a produção do biocombustível ou de açúcar.
Contando com a unidade da Tietê no município de Paraíso (SP), que produz etanol e açúcar, a companhia tem uma capacidade de processar 3,7 milhões de toneladas de cana por safra. Com a limitação atual em Ubarana, porém, a Tietê destina atualmente 75% a 80% de seu caldo de cana para a produção do biocombustível, com pouca margem para alteração nesse mix. "Com a fábrica de açúcar, vamos ter um mix mais próximo de 50% para cada", sinalizou Gaeta.
A busca por um financiador que já atue no setor é uma alternativa que a Tietê e outras companhias têm buscado diante da restrição de crédito nos bancos e uma estratégia para não afetar o fluxo de caixa da companhia. "Prefiro destinar meu caixa para investimentos de curto prazo", disse o executivo.
Essa também é a estratégia da destilaria Alcoeste, controlada pelo Grupo Arakaki. A companhia está concluindo uma negociação com uma grande trading internacional que deverá financiar um aporte de R$ 20 milhões para a construção de uma fábrica de açúcar, com capacidade para produzir entre 80 mil e 100 mil toneladas a cada safra. "Embora proporcionalmente este número não seja expressivo, esta capacidade para acessar capital novo não é a situação da maioria das empresas do setor", disse Luis Gustavo Corrêa, sócio da FGAgro, que está prestando consultoria à Alcoeste.
Pelos termos sob os quais o acordo está sendo costurado, a trading pagará um preço mínimo para garantir a margem da companhia. A expectativa é que o investimento seja pago em uma safra.
Um investimento em fabricação de açúcar que já está em andamento é o da destilaria Bioenergética Aroeira, no município de Tupaciguara (MG). A unidade recebeu um aporte de R$ 50 milhões, dos quais 30% saíram do caixa da companhia e 70% foram financiados pelo BNDES. "Não tem como investir neste setor se não tem condição de financiamento como essa", afirmou José Rubens Bevillaqua, diretor da Aroeira.
A decisão foi tomada em abril, no esteira da valorização dos preços internacionais do açúcar. Com o aporte, a Aroeira terá capacidade para produzir 120 mil toneladas de açúcar por safra. Esse passo, contudo, não significa que a companhia deixará de apostar no etanol. Para Bevillaqua, a perspectiva para esse mercado é positiva e o biocombustível continuará a ser o produto principal da companhia.
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