Dívida crescente: R$ 77 bi deve ser o endividamento total do setor sucroenergético em 2015. Segundo dados da Uniião da Indústria da Cana-de-Açúcar (Única), no próximo ano, as empresas vão dever 110% do que faturam.
Mais um grupo sucroalcooleiro se junta ao extenso rol das endividadas usinas de açúcar e etanol que estão deixando um rastro de calote no País e no exterior. O grupo Unialco, do interior de São Paulo, deixou de pagar R$ 500 milhões aos bancos e está renegociando a dívida para estendê-la para os próximos cinco anos. Os bancos, por sua vez, estão encalacrados com empréstimos que não tinham garantias suficientes, como fazendas ou equipamentos que pudessem ser agora retomados.
A renegociação está avançada e um dos pontos acertados é a venda da empresa ou de pelo menos parte dela a um novo grupo. Não haverá desconto do valor total. No entanto, os bancos concordaram que a maior parte da dívida seja paga no final do novo prazo que está sendo dado. É a segunda vez em menos de cinco anos que a empresa deixa de pagar os bancos, entre eles Santander, Itaú, Unibanco, Bradesco e Banco Vororantim.
O dono da Unialco, Luiz Guilherme Zancaner (foto), em entrevista por telefone ao Estado, não quis dar detalhes sobre como está resolvendo a questão da dívida. Disse apenas que a empresa, que tem 2,1 mil funcionários, está centrada em garantir a plantação da próxima safra.
“Uma usina sem cana-de-açúcar é igual ferro-velho, e os bancos precisam entender isso”, disse Zancaner. “Vamos financiar a próxima safra na raça”. Uma alternativa é que as cooperativas de fornecedores de adubos, por exemplo, possam fazer esse financiamento em troca da venda antecipada de açúcar.
A safra deste ano, no entanto, já não foi nada boa para a Unialco, que possui usinas em São Paulo e Mato Grosso do Sul. A seca que tomou conta da Região Sudeste, a ponto de comprometer o abastecimento de água no Estado, foi responsável pela quebra da futura safra do grupo. A moagem da cana foi 20% menor que a estimada. Além disso, os preços do açúcar e etanol caíram, deixando um prejuízo de R$ 157 milhões no balanço da safra 2013/2014.
Segundo o advogado da Unialco, Dirceu Carreto, do escritório CP Advogados, nenhum pagamento foi feito aos bancos neste ano por causa das dificuldades com a safra. Sem receber, o grupo de sete bancos entrou na Justiça para cobrar a dívida, com o auxílio do escritório Tepedino, Migliore e Berezoswki. Mas, como as garantias do empréstimo não suprem o total devido e diante da demora dos processos judiciais, os bancos decidiram voltar à mesa de negociações. O objetivo é tentar evitar uma recuperação judicial, que poderia deixar a empresa alguns anos sem plantar e agravar a situação. Procurados, os bancos preferiram não comentar o assunto.
Carreto diz que a negociação está avançada, com os termos já aceitos por ambas as partes, restando apenas que os advogados redijam o novo contrato. Mesmo com o compromisso de vender a empresa, ou parte dela, algumas fontes próximas às negociações dizem que será difícil pagar a dívida sem que os bancos concedam algum desconto.
A crise na Unialco começou por causa de investimentos em duas usinas que acabaram não dando certo, no ano de 2008. Em 2010, a empresa renegociou as dívidas com os bancos, que se uniram em um único grupo para poder ter a garantia das futuras safras da empresa. Mas essa garantia venceu neste ano e, por isso, os bancos ficaram sem muitas opções, a não ser renegociar.
Crise no setor
As dificuldades de tantas empresas no setor já estão limitando o crédito para as empresas em geral. A situação vivenciada pela Unialco parece ter se tornado corriqueira. Há poucos meses, o grupo Virgulino de Oliveira anunciou que teria de renegociar US$ 735 milhões com credores internacionais, que compraram títulos da empresa. Apesar de a dívida vencer a partir de 2022, a empresa não está conseguindo nem mesmo pagar os juros. No início do ano, uma grande recuperação judicial foi anunciada, a do grupo Aralco, com dívidas de mais de R$ 1 bilhão.
Segundo estimativas da Datagro, pelo menos 30 empresas entraram em recuperação judicial, a antiga concordata, nos últimos anos no País. Desde 2008, segundo levantamento do Itaú BBA, 60 usinas de açúcar e álcool fecharam as portas. A estimativa é de que o setor tenha em 2015 um endividamento total de R$ 77 bilhões.
Neste ano, alguns analistas já avaliam que a dificuldade de pagar os juros está sendo generalizada. Na sexta-feira, a agência de classificação de risco Standard & Poor’s, rebaixou as notas de risco da USJ Açúcar e Álcool. Segundo nota da S&P, o rebaixamento se deu por causa do aumento da alavancagem da empresa, que também está bastante endividada, e a expectativa de que terá um fluxo de caixa negativo.
Crédito para financiar o giro do setor está escasso
As perspectivas para 2015 das empresas de setor de açúcar e álcool não são as melhores. Altamente endividadas, com fluxo de caixa comprometido por causa dos baixos preços do açúcar e do etanol e tendo de lidar com o clima adverso e aumento de custos, a situação deve ficar ainda mais delicada com a escassez de crédito para financiamento das safras.
A agência de classificação de risco Fitch Ratings, em recente relatório sobre o setor, foi taxativa: “A expectativa é que o risco sistêmico do setor no Brasil cresça e reduza a disponibilidade de financiamento de capital de giro em consequência do enfraquecimento financeiro de importantes players domésticos”.
Dados da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Única) mostram que as usinas de açúcar e etanol devem encerrar a safra do próximo ano devendo 110% do seu faturamento, que hoje é de R$ 70 bilhões. O Banco Itaú BBA, que faz um acompanhamento de 65 empresas que representam dois terços de todo o setor, mostra que em dez anos o endividamento destas companhias cresceu 19 vezes.
O grande salto da dívida das usinas de açúcar e etanol se deu entre os anos de 2008 e 2009, quando houve um investimento maciço para aproveitar a onda de carros biocombustíveis e também os inestimentos em cogeração de energia do bagaço da cana. Mas a demanda acabou frustrada. Os leilões de energia para a cogeração deixaram de ocorrer e, apesar de os carros flex continuarem em grande produção, a concorrência com o preço da gasolina tem dificultado a vida do setor.
De acordo com Plinio Nastari, da Datagro, mais de 30 empresas entraram em recuperação judicial nos últimos anos. Além dos subsídios da gasolina, Nastari diz que a indústria sofreu com o clima adverso e, no caso das usinas paulistas, também pelos infestimentos no processo de mecanização, que foram antecipados por causa de um acordo com o governo do Estado para reduzir a queimada da palha antes da colheita.
Um outro ponto que também ajudou a piorar o cenário para o setor foi a queda dos preços do açúcar no mercado internacional. O relatório da Fitch Ratings intitulado “Perspectiva 2015: Açúcar e Etanol na América Latina” diz que a recuperação está demorando mais do que o previsto em razão dos elevados níveis de estoque do produto e da desvalorização das moedas dos países exportadores que estão forçando os preços para baixo.
Para o etanol, a situação deve ter alguma melhora depois do anúncio de reajuste do preço da gasolina pela Petrobras, mas para a Fitch isso vai significar apenas uma “modesta alta”.
“Se os preços do açúcar e do etanol não se recuperarem rápida e substancialmente, o atual nível de queima de caixa e a fraca posição de liquidez resultarão em rebaixamentos (de nota de risco das empresas) no curto prazo”, diz a Fitch
Fonte: O Estado de S. Paulo
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