Sob crescente pressão em meio à operação Lava-Jato e a crise que afeta a imagem e a saúde financeira da Petrobras, a presidente da maior empresa brasileira, Maria das Graças Foster, enfrenta o desafio de gerir a turbulência e reconquistar credibilidade junto ao mercado e à opinião pública.
Analistas ouvidos pela BBC Brasil acreditam que, além do desafio de se manter no cargo - algo que para alguns já é insustentável - Graça Foster terá de reforçar a governança na empresa - dar um "choque de transparência e credibilidade", nas palavras de um analista - a fim de recolocar os negócios no centro das preocupações da petroleira.
Para eles, é imprescindível que a Petrobras caminhe para um descolamento do governo federal e dos partidos.
Isto se daria através de reformas que reduzam ao máximo a ingerência política nos rumos da empresa - incluindo as nomeações pelo Planalto, que deveriam reduzir-se aos cargos de presidente e chefe do conselho de administração, permitindo a seleção de diretores seguindo critérios de mérito e competência.
Os especialistas também apontam para a pressão do relógio. A empresa já citou a possibilidade de operar por até seis meses sem captar novos recursos. Mas quanto mais tempo ficar sem acesso ao mercado financeiro, maiores serão os juros pagos em novos empréstimos, e maior o impacto sobre os planos de investimento da empresa - entre eles o pré-sal, cuja exploração pode sofrer desaceleração diante da falta de caixa da companhia.
Evitar 'traumas'
John Forman, que foi diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP) quando Graça ocupava a Secretaria de Petróleo e Gás do Ministério de Minas e Energia, diz que as mudanças no comando da companhia devem ocorrer de forma "orgânica" e "sem traumas", em paralelo à reforma ministerial, em janeiro.
Mas ele acredita que a estatal precisa de alguém com certas qualidades específicas.
"A Graça demonstra comportamento administrativo e background técnico de alto nível, mas numa crise como essa, você precisa alguém com carisma, com jogo de cintura para contornar grandes dificuldades", disse Forman à BBC Brasil.
Uma receita para a Petrobras segundo os analistas
liderança precisa de carisma e jogo de cintura para contornar crise;
manter a companhia em operação em meio às pressões financeiras e impossibilidade de acessar o mercado para captar recursos;
promover maior diálogo com os acionistas;
reduzir ingerências políticas do Planalto;
promover descolamento da política econômica do governo;
reduzir nomeações políticas aos cargos de presidente e chefe do conselho (diretores devem ser selecionados com base em mérito e competência);
promover "limpeza" na cúpula, com demissões de presidência, diretoria e conselho de administração;
implementar reformas e medidas que tragam mais vigilância interna, controle de áreas vulneráveis, e aumentem transparência e governança
Para Claudio Abramo, diretor-geral da Transparência Brasil, a troca da cúpula da Petrobras é inevitável.
"A permanência da chefia, diretores e conselho de administração é insustentável. Seja por ligação às denúncias ou por omissão, todos esses funcionários devem sair, o quanto antes, para que a companhia dê início à reorganização da casa", avalia.
Já Marcelo Ferrari, diretor da consultoria internacional Mercer, compara as denúncias envolvendo a petroleira à queda de um superjumbo.
"Ao atingir a Petrobras do jeito que atingiram, é como se tivessem derrubado um superboeing. É algo de grande magnitude, e se estivéssemos falando de uma companhia 100% privada, todas essas cabeças já teriam rolado", diz.
Apesar de defender alterações de cúpula, ele relembra que os desafios maiores serão as reformas. "Não adianta você demonizar uma outra figura. Isso acaba ofuscando a necessidade de mudanças. A questão agora é como vai se dar o choque de transparência e credibilidade necessário para retomar os negócios o mais rápido possível", complementa.
Credibilidade e transparência
Embora tenham anunciado no início da semana a intenção de criar uma diretoria de governança, durante uma tensa entrevista coletiva, os diretores da Petrobras terão que abraçar metas muito maiores, acreditam os analistas ouvidos pela BBC Brasil.
"Este anúncio não surtiu muito efeito positivo no mercado. É preciso fazer uma verdadeira cirurgia na empresa, um pacote extenso de mudanças. Ninguém vai querer assumir o comando sem garantias de que haverá mudanças importantes na forma como a Petrobras é conduzida e como se relaciona com o governo", diz Adriano Pires, consultor do setor de Petróleo e Gás do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).
Na visão dele, três pilares sólidos ainda ajudam a sustentar a companhia: um corpo técnico de alta qualidade, a reserva de petróleo, e tecnologia de ponta.
"A este tripé, é necessário acrescentar o mais rápido possível a qualidade administrativa. Governança, reformas, transparência, mecanismos de vigilância ecompliance (aderência à norma), contratação de consultorias externas, descolamento da política econômica do governo, distanciamento do Executivo e das ingerências políticas são algumas das medidas que devem integrar este pacote", avalia.
Claudio Abramo, da Transparência Brasil, diz que o Brasil deve aproveitar a oportunidade para rever questões complexas que aumentam as chances de corrupção envolvendo a Petrobras.
"Além desta lógica de loteamento de diretorias para partidos políticos, que deve ser interrompida imediatamente, é preciso rever questões como as leis de licitação da Petrobras. É praticamente impossível questionar uma licitação da petroleira, e as regras específicas facilitam a formação de cartéis.
SBM Offshore
Questionados sobre a empresa holandesa SBM Offshore, envolvida nas denúncias, os especialistas apontam que o caso é uma das indicações de desgaste da imagem da administração da Petrobras e das vulnerabilidades da petroleira.
No início da semana, Graça Foster admitiu ter recebido a confirmação, meses atrás, de que a SBM pagara propina a executivos da Petrobras, mas que uma investigação interna não encontrou evidências de irregularidades.
Ao comentar o caso, Claudio Abramo cita uma entrevista do então presidente da Petrobras, Sérgio Gabrielli, ao programa Roda Viva, da TV Cultura, em 2012.
"Na época, o questionei sobre as dificuldades de gerir uma empresa cujos diretores são nomeados politicamente. Ele me disse que havia mecanismos de vigilância e governança que garantiam transparência. Da mesma forma que não tenho elementos para acreditar nisso, também não acredito nesta sindicância interna no caso da empresa holandesa. Só mesmo a reorganização total da empresa pode garantir credibilidade e transparência neste momento", avalia.
Fonte: BBC Brasil
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