Depois de quase vinte anos no cargo de diretor-executivo da Organização Internacional do Açúcar (ISO, na sigla em inglês), o alemão Peter Baron deixará em dezembro o cargo para se aposentar. Quando assumiu a função, o Brasil ainda emergia no comércio internacional da commodity, com algo próximo de 6% de participação, ainda atrás de importante produtores, como os europeus e os cubanos. Atualmente, o açúcar brasileiro é líder das exportações globais, com fatia de 50%, façanha que Baron, naquela época, jamais imaginaria ser possível.
Mas essa não foi a única das surpresas que o Brasil trouxe ao mercado de açúcar. Para Baron, a diversificação brasileira a partir da cana-de-açúcar, com a produção de etanol e eletricidade em larga escala, é um exemplo do que indústria açucareira mundial, responsável por ofertar 175 milhões de toneladas do produto por ano, deveria fazer para se proteger dos altos e baixos cada vez mais frequentes desse mercado.
"Até os mais eficientes produtores de açúcar não vão conseguir avançar sem diversificação. Esse exemplo vem do Brasil. Não importa o que acontecer no mercado mundial, a indústria brasileira sobrevive melhor", avalia Peter Baron. À diversificação, o executivo acrescenta os novos produtos provenientes da sacarose da cana, como os bioquímicos e os bioplásticos.
Em recente entrevista ao Valor durante a conferência de açúcar da Datagro, em São Paulo, Baron recordou que quando chegou à ISO, em 1995, encontrou uma associação praticamente falida, com a quebra do então regime soviético, que debilitou a maior potência açucareira da época, Cuba. "Não sabíamos como pagaríamos os salários ou o aluguel", lembra. Naquela época, o Brasil exportava em torno de 2 milhões de toneladas de açúcar, bem abaixo das cerca de 27 milhões de toneladas atuais.
A guinada da indústria açucareira do Brasil naquele contexto teve uma grande "ajuda" do etanol, na visão de Baron. Ele se lembra da primeira vez em que participou de um workshop no Brasil com tema etanol e meio ambiente. "Aquilo parecia não fazer o menor sentido. Os membros da organização me questionavam: o que eles estão fazendo? Hoje, a energia está no topo das preocupações do mundo", afirma.
A ISO tem entre suas funções a elaboração de estatísticas e estudos especiais e atualmente 50% das encomendas nesse sentido têm como tema a "diversificação". Apesar do ambiente de mercado retraído para o etanol neste momento, o diretor da organização acredita que o biocombustível ainda se tornará, sim, uma commodity internacional e terá um papel importante, particularmente em países menores. "Para eles, será importante produzir etanol, mesmo se não forem os mais eficientes. Ao ser considerado o gasto para importar petróleo, produzir etanol pode ser uma grande vantagem", diz Baron.
O entusiasmo do diretor da Organização Internacional de Açúcar com o etanol não significa que as perspectivas para o açúcar não sejam promissoras. Segundo Baron, o crescimento da demanda mundial por açúcar, de 2% a 2,5% ao ano, representa um consumo adicional de 3 milhões de toneladas.
Essa procura, consequência do aumento do consumo de produtos industrializados na Ásia, manterá esses níveis de crescimento no futuro, na avaliação de Baron. "Há dez anos, o aumento no consumo de açúcar era devido, em 80% dos casos, ao crescimento da população. Hoje, o principal motivo é o aumento da renda", afirma Baron.
Apesar de não esboçar dúvidas sobre a pujança da demanda, Baron avalia que, sobreviverá melhor, quem investir em outros segmentos como o dos bioquímicos, bioplásticos, etanol e eletricidade. "Em 2020, somente o Brasil estará direcionando o equivalente a 6 milhões de toneladas de açúcar (ou 4 bilhões de litros de etanol) para produção de bioquímicos", estima.
Uma maior concentração na exportação de açúcar tende a ocorrer nos próximos anos, com o Brasil mantendo a liderança, afirma Baron. "O que aconteceu com as usinas brasileiras foi claramente um impacto da crise financeira. Isso vai mudar", diz, numa referência aos problemas que afetaram o setor.
Austrália e Tailândia seguirão como importantes players, mas a Índia pode surpreender, na visão de Baron. Ele enxerga um movimento de menor interferência do governo indiano no mercado de açúcar. "A indústria indiana está sendo menos regulada", acredita.
Fonte: Valor
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